Guerra na Síria: rebeldes chegam aos arredores de Damasco, e Exército de Assad tenta evitar tomada da capital
07/12/2024
Grupos liderados por extremistas islâmicos querem destituir o ditador Bashar al-Assad, no poder há 24 anos. Guerra civil já dura 13 anos, mas teve novo impulso nos últimos dias. Entenda o que está acontecendo na Síria, que tem avanço de grupo rebelde
As forças rebeldes que tentam derrubar o ditador sírio Bashar al-Assad, no poder há 24 anos, anunciaram neste sábado (7) que tomaram o controle total de Homs, a terceira maior cidade do país, além de Quneitra, perto da fronteira com Israel, e Sanamayn, a cerca de 20 km da entrada sul de Damasco.
Combatentes liderados pelo movimento extremista Hayat Tahrir al-Sham (HTS), ou Organização para a Libertação do Levante, chegaram aos subúrbios da capital. O Hayat Tahrir surgiu como uma filial da Al Qaeda, o grupo terrorista por trás dos atentados do 11 de Setembro.
Relatos de moradores de Damasco publicados pela agência de notícias Associated Press indicam que a cidade está com segurança reforçada. Há corrida aos mercados e falta de alimentos.
Autoridades sírias disseram à agência Reuters que soldados e comandantes do regime de Assad já deixaram Homs, e fontes ligadas à milícia rebelde afirmaram que o grupo entrou no quartel central da cidade e tomou um presídio. Centenas de presos fugiram.
Homs é um ponto crítico no conflito, já que conecta Damasco à costa mediterrânea, onde estão localizadas bases militares da Rússia, principal aliada de Assad.
O ministro do Interior da Síria, Mohamed al Rahmun, afirmou que as forças oficiais de segurança estabeleceram um cordão "muito forte" ao redor de Damasco, para evitar a tomada da capital.
"Há um cordão militar e de segurança muito forte nos limites de Damasco e sua área rural, e ninguém (...) pode penetrar na linha de defesa que nós, as Forças Armadas, estamos construindo", disse o ministro na televisão estatal.
Em uma reunião no Catar, representantes de Rússia, Turquia e Irã pediram diálogo entre o governo sírio e as forças opositoras. No entanto, o chanceler russo, Sergei Lavrov, disse que a negociação não deve incluir os extremistas do HTS. "É inaceitável permitir que um grupo terrorista assuma o controle de territórios", afirmou o ministro de Putin, segundo a agência de notícias russa Tass.
O líder do movimento rebelde, Abu Mohammed al-Golani, disse ao jornal americano The New York Times que o objetivo é derrubar Assad e "libertar a Síria de seu regime opressivo". Segundo ele, as tropas do Exército sírio estão enfraquecidas e desmoralizadas. "Esta operação quebrou o inimigo."
Abu Mohammed al-Golani, líder das forças rebeldes que tentam derrubar ditador Bashar al-Assad na Síria
Media Branch of Syrian Rebel Operations Room/via Reuters
A guerra civil na Síria começou em 2011 e, nos últimos quatro anos, parecia estar adormecida.
Em uma ofensiva relâmpago, os rebeldes tomaram grandes cidades, começando por Aleppo (a segunda maior), e chegaram aos arredores da capital em apenas 10 dias. O avanço se dá pelo norte e pelo sul.
No leste do país, onde está a fronteira com Iraque e Turquia, quem desafia Assad são os curdos.
Presidente da Síria Bashar al-Assad, que governa o país desde a morte de seu pai, em 2000.
JOSEPH EID / AFP
Na guerra que já dura 13 anos e tem 500 mil mortos (sendo 200 mil civis), o ditador conseguiu manter o controle sobre a maior parte do território porque tem apoio de aliados poderosos como a Rússia, o Irã e a milícia libanesa Hezbollah.
No entanto, o momento turbulento em outras partes do mundo não favorece a Síria. Irã e Hezbollah estão enfraquecidos pelo conflito com Israel e a Rússia trava guerra com a Ucrânia que já dura dois anos.
Um porta-voz do governo da Ucrânia disse que a escalada do conflito na Síria mostra que a Rússia não consegue lutar em duas guerras ao mesmo tempo.
O cientista político Guilherme Casarões, da Fundação Getúlio Vargas, diz que não é uma coincidência a ofensiva ter sido lançada agora.
"Aqueles que eram os três principais aliados do governo Assad, Hezbollah, Irã e Rússia, estão meio que fora desse envolvimento direto com o conflito, o que abriu uma oportunidade para que os rebeldes tentassem retomar certas posições estratégicas dentro do país. Aleppo, sendo a segunda maior cidade da Síria, é o primeiro destino que eles ocuparam."
Segundo o professor, o acirramento do conflito pode ter consequências em todo o Oriente Médio. Se Assad cair, afirma ele, isso pode criar um vácuo de poder e escalar ainda mais as guerras que envolvem Israel, Hamas, Hezbollah e Irã.
Rebeldes comemoram tomada de aeroporto militar na cidade de Hama, na Síria
Mahmoud Hasano/REUTERS
'Derrubada próxima'
Em mensagens no aplicativo Telegram, forças rebeldes disseram que a resistência anunciada pelo governo sírio não passa de fake news: "estamos agora na porta de Homs e Damasco, e a derrubada do regime criminoso está próxima".
Os rebeldes afirmam que não vão atacar prédios do governo, nem escritórios da ONU. Também descartam o uso de armas químicas.
Informações da agência estatal de notícias do Iraque apontam que mais de mil soldados do exército sírio cruzaram a fronteira do Iraque.
Já o Líbano disse que está fechando todas as suas travessias de fronteira terrestre com a Síria, exceto uma principal que liga Beirute a Damasco. A Jordânia também fechou a fronteira.
✅ Clique aqui para seguir o canal de notícias internacionais do g1 no WhatsApp
Desde sexta, os rebeldes vêm avançando e tentam montar um cerco à capital (veja no mapa abaixo). Segundo reportagem do jornal "The Wall Street Journal, autoridades do Egito e da Jordânia pediram que Assad deixe o país. Não há informações de que isso tenha ocorrido.
Veja a cronologia do avanço rebelde na Síria
Infográfico/g1
O que está acontecendo na Síria
A ofensiva dos rebeldes reacendeu a guerra na Síria, que acontece desde 2011. O conflito estourou durante manifestações da Primavera Árabe, que foram duramente reprimidas pelo exército de Assad.
Naquele momento, as manifestações começaram de forma pacífica, com movimentos pedindo mais democracia e liberdades individuais. Os manifestantes também acusavam o governo de corrupção e nepotismo.
Diante da repressão violenta do Exército, o governo sírio viu surgir uma revolta armada apoiada por militares desertores e grupos de terroristas islâmicos. Nesse contexto, começou uma guerra civil.
À época, grupos rebeldes entraram em conflito com as forças de Assad, que perdeu o controle de alguns territórios, mas conseguiu se manter no poder, graças sobretudo ao suporte de Rússia e Irã. Com o tempo, Assad retomou o controle de cerca de 70% do território.
Repercussão internacional
Donald Trump em Paris, 7/12/2025
Sarah Meyssonnier / Pool / AFP
O presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, que toma posse em janeiro, defendeu que o país não deve se envolver no conflito.
"A Síria é uma bagunça, mas não é nossa amiga, e os Estados Unidos não têm nada a ver com isso. Esta luta não é nossa, deixem que aconteça. Não se envolvam", escreveu Trump em um post na rede Truth Social.
O presidente da Turquia, Tayyip Erdogan, disse que cabe ao povo sírio decidir o futuro do país. "Agora há uma nova realidade na Síria, política e diplomaticamente. E a Síria pertence aos sírios com todos os seus elementos étnicos, sectários e religiosos", disse.
"O povo da Síria é quem decidirá o futuro de seu próprio país. Como Turquia, nosso desejo é que a nossa vizinha Síria recupere rapidamente a paz, a estabilidade e a tranquilidade que tanto anseia há 13 anos", completou Erdogan. Há anos, a Turquia apoia forças de oposição na Síria.
O ministro das Relações Exteriores da Alemanha, Tobias Lindner, pediu que as partes envolvidas no conflito "diminuam a tensão e lembrem de sua obrigação de proteger os civis".